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Este robô é menor que um grão de sal – e funciona sozinho

Alimentado por minúsculos painéis solares, o dispositivo percebe o ambiente, toma decisões simples e se move de forma independente.

Por Luiza Lopes
16 dez 2025, 19h00 •
  • Cientistas das universidades da Pensilvânia e de Michigan, nos EUA, anunciaram a criação do menor robô autônomo e totalmente programável já desenvolvido. Invisível a olho nu, ele é medido em micrômetros, que é 10 mil vezes menor que um centímetro. O robôzinho tem 200 por 300 por 50 micrômetros de dimensões – é menor do que um grão de sal e próximo do tamanho de um microrganismo unicelular. 

    Mas tamanho não é mesmo documento: ele consegue perceber o ambiente, tomar decisões simples, se mover de forma independente e operar por meses sem controle externo. O feito foi descrito em dois artigos científicos complementares, publicados na Science Robotics e nos Anais da Academia Nacional de Ciências (PNAS) .

    Reduzir robôs a essa escala é um desafio perseguido pela engenharia há décadas. O problema não é apenas “encolher” peças. Quando um objeto passa do tamanho humano para o microscópico, as regras físicas que governam seu movimento mudam radicalmente. 

    No nosso cotidiano, forças como a gravidade e a inércia dominam: uma bola continua rolando depois de empurrada; um carro mantém velocidade até frear. Em escalas microscópicas, essas forças quase desaparecem. Em seu lugar, entram em cena o arrasto e a viscosidade do fluido ao redor.

    Na prática, isso significa que, para um robô microscópico submerso em água, mover-se é como tentar atravessar um tanque de melaço. A água, que para nós parece “leve”, se comporta como um material espesso e pegajoso. 

    Qualquer tentativa de empurrá-la com pernas, pás ou hélices – estratégias comuns em robôs maiores – se torna extremamente ineficiente ou simplesmente inviável. Além disso, estruturas móveis em microescala quebram com facilidade e são muito difíceis de fabricar com precisão.

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    A miniaturização também impõe limites severos à eletrônica. Quanto menor o chip, menor a área disponível para armazenar energia. Baterias convencionais simplesmente não cabem em um dispositivo desse tamanho. 

    Mesmo captar energia do ambiente é difícil: superfícies menores coletam menos luz, menos calor e menos energia em geral. Ao mesmo tempo, circuitos eletrônicos nunca são perfeitamente isolados e sempre “vazam” energia, mesmo quando estão em repouso. Em chips muito pequenos, esse vazamento passa a representar uma fração significativa do consumo total, tornando o funcionamento contínuo um desafio.

    Como o robô foi criado?

    Para contornar esse conjunto de problemas, as equipes adotaram uma estratégia inspirada na indústria de semicondutores, o setor responsável pela fabricação de chips usados em computadores, celulares e sensores. 

    Em vez de montar robôs peça por peça, os pesquisadores fabricaram centenas deles simultaneamente em uma única lâmina de silício, usando processos industriais de litografia. Essa técnica permite desenhar circuitos, sensores e estruturas com precisão nanométrica, camada por camada, de forma altamente padronizada e barata quando feita em grande escala.

    Dentro de cada robô está um computador microscópico completo: processador, memória, sensores, circuitos de comunicação e pequenos painéis solares. Esses painéis ocupam a maior parte da área do dispositivo, justamente porque captar energia suficiente é o maior gargalo do sistema.

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    Ainda assim, toda a operação do robô consome apenas cerca de 75 nanowatts – em torno de 100 mil vezes menos energia do que um smartwatch em funcionamento.

    Para alcançar esse nível extremo de eficiência, os engenheiros precisaram redesenhar o próprio modo como o computador “pensa”. Em computadores comuns, tarefas simples exigem longas sequências de instruções armazenadas na memória. Aqui, isso seria inviável.

    A solução foi criar um conjunto de comandos altamente compactados, em que uma única instrução pode representar uma ação complexa, como medir a temperatura ao redor ou executar um padrão específico de movimento. Com isso, o robô consegue tomar decisões básicas e reagir ao ambiente usando apenas algumas centenas de bits de memória. É uma quantidade ínfima, mesmo para padrões eletrônicos.

    A locomoção exigiu uma reinvenção ainda mais radical. Em vez de tentar empurrar o próprio corpo pela água, os robôs usam um princípio chamado propulsão eletrocinética. Pequenos eletrodos de platina, integrados ao corpo do dispositivo, geram um campo elétrico no líquido ao redor. 

    Esse campo faz com que íons dissolvidos na água se desloquem. Ao se moverem, esses íons arrastam as moléculas de água próximas, criando um fluxo microscópico. O robô, então, é carregado por esse fluxo.

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    É uma inversão completa da lógica usual: em vez de o robô empurrar a água, ele faz a água se mover ao seu redor. Como não há partes móveis, o sistema é extremamente robusto. Os robôs podem ser transferidos repetidamente entre amostras com uma micropipeta sem sofrer danos e continuam funcionando por meses.

    Controlando quais eletrodos são ativados e com que intensidade, o robô consegue se deslocar para frente, girar, fazer curvas e até executar trajetórias complexas. Em testes, atingiu velocidades da ordem de um comprimento corporal por segundo – um desempenho significativo para dispositivos desse tamanho.

    A autonomia real, no entanto, só aparece quando movimento e percepção se combinam. A versão descrita na Science Robotics inclui sensores eletrônicos de temperatura capazes de detectar variações de cerca de 0,33° C.

    Em termos biológicos, isso é suficiente para captar mudanças associadas à atividade celular. Os pesquisadores programaram os robôs para reagir a essas variações, alterando seu padrão de movimento ao encontrar regiões mais quentes ou mais frias em um líquido.

    Em microescala, transmissão dessas informações para o mundo externo é outro desafio. Antenas de rádio seriam grandes demais e ineficientes. A solução encontrada foi transformar o próprio movimento em linguagem. 

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    Para relatar uma medição, o robô executa uma sequência específica de deslocamentos, que pode ser registrada por um microscópio e decodificada pelos pesquisadores. 

    A programação também é feita por luz. Pulsos luminosos alimentam os robôs e, ao mesmo tempo, carregam instruções digitais. Cada unidade possui um identificador próprio, o que permite que diferentes robôs recebam comandos distintos, mesmo estando no mesmo ambiente. Isso abre a possibilidade de tarefas coletivas, em que cada robô desempenha um papel específico dentro de um grupo coordenado.

    As aplicações potenciais vão da biomedicina a engenharia de materiais. Em laboratório, esses robôs poderiam monitorar células individuais ao longo do tempo, acompanhando alterações térmicas associadas a processos metabólicos ou patológicos.

    Na indústria, poderiam ajudar a montar ou inspecionar estruturas em microescala, onde ferramentas convencionais não alcançam. Cada robô sai por US$ 0,01 e eles podem ser fabricados em massa por isso, os pesquisadores imaginam usos em grandes quantidades.

    Os autores ressaltam, porém, que este é apenas o início. Versões futuras devem incorporar novos sensores, programas mais sofisticados, maior velocidade e capacidade de operar em ambientes mais complexos. 

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    “Mostramos que é possível inserir um cérebro, um sensor e um motor em algo quase invisível a olho nu, e que ele sobreviva e funcione por meses”, afirmou Marc Miskin, da Universidade da Pensilvânia, em comunicado. “ Uma vez estabelecida essa base, é possível adicionar todos os tipos de inteligência e funcionalidade. Isso abre as portas para um futuro completamente novo da robótica em microescala”.

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