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Homicídios caíram em São Paulo. Quem é o responsável: PCC ou governo?

Novo estudo analisando estatísticas de violência mostra que o motivo da diminuição dos assassinatos no estado é mais complexo do que parece.

Por Eduardo Lima
6 jul 2024, 16h00

Do início da década de 1990 até 2017, enquanto o mundo navegava em uma tendência de menos violência, o Brasil foi na direção contrária e viu sua taxa de homicídios crescer. Tanto que, em 2019, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime mostrou que somos um dos países mais violentos do mundo.

Na virada do milênio, porém, uma das regiões mais violentas do país mudou de rota. O jornalista e pesquisador da USP Bruno Paes Manso conta em seu livro A fé e o fuzil, publicado pela editora Todavia, que os homicídios no estado de São Paulo começaram a se multiplicar a partir da década de 1960. Em 1999, a cidade atingiu o número de 65 mil assassinatos por cada 100 mil habitantes. Porém, a partir de 2000, essa tendência de crescimento se inverteu.

A diminuição das estatísticas de violência continua até hoje. Em 2023, a cidade de São Paulo registrou o menor número de homicídios desde o início da série histórica, em 2001. Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Estado, foram 481 assassinatos no ano passado, em comparação com 5174 casos no começo do milênio.

Entre 2000 e 2017, as taxas de homicídios diminuíram 76,6% no estado de São Paulo, enquanto aumentaram 76,8% no resto do país. A partir de 2018, há uma tendência de queda em outras unidades federativas, mas nenhum caso se compara ao de SP.

O que será que fez a violência diminuir na capital e no estado paulista? O assunto é motivo para debates extensos entre diferentes pesquisadores. Uma das hipóteses que mais chamou a atenção é a de que o principal responsável pela pacificação seja o Primeiro Comando da Capital (PCC), a maior organização criminosa do Brasil, fundada em 1993 em Taubaté, no interior do estado.

Será que é isso mesmo? O pesquisador Bruno Alvarenga, da Universidade de São Paulo (USP), questiona a ideia.

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PCC contra a violência?

A ideia de que o PCC possa ter um papel especial na diminuição dos homicídios em São Paulo começou a circular no debate acadêmico em 2008, por meio de uma tese de Gabriel Feltran, sociólogo da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Tanto nas suas pesquisas como na tese de Camila Nunes Dias, socióloga da Universidade Federal do ABC (UFABC), um dos motivos apontados para a diminuição da violência é a normalização do “proceder” e da “disciplina” do PCC, uma ética interna da organização. Vamos explicar.

Até o crime funciona com leis. A disciplina exigida dos integrantes do PCC inclui o autocontrole das emoções, a ponderação no uso de drogas e julgamentos internos e debates para mediar conflitos. Onde antes a violência rolava solta, uma força centralizadora ajudaria a diminuir vinganças e brigas entre membros de grupos diferentes na periferia de São Paulo.

A hegemonia do PCC no mundo do crime e as regras impostas pela organização seriam os fatores que explicam a diminuição dos homicídios em São Paulo. Mas, no recente estudo de Alvarenga, publicado na revista científica Cadernos de Gestão Pública e Cidadania, alguns outros fatores mostram que talvez não seja tão simples assim.

Taxa já estava em queda

Um dos primeiros fatores que mostram que a responsabilidade da diminuição da violência não é só do PCC foi apontado por Paes Manso em sua tese de doutorado pela USP, em 2012. A organização criminosa só começou a atuar de forma organizada, mediando conflitos nos territórios, a partir de 2006. Àquela altura, a taxa de homicídios em São Paulo já estava acontecendo em ritmo acelerado.

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Analisando a hipótese, Alvarenga tentou encontrar uma correlação entre as reduções de taxas de homicídios e os bairros paulistanos com maiores proporções de residentes em favelas, onde o PCC teria um domínio maior. Há uma “diferença sutil”, sim, segundo Alvarenga, mas não o suficiente para dizer que esse é o único motivo para a diminuição.

Entrando em contato com outras hipóteses de pesquisadores para explicar a diminuição das taxas de homicídios em São Paulo, Alvarenga construiu um modelo estatístico que poderia abarcar todos os possíveis fatores, indicando quais seriam os mais significantes para a queda da violência.

Os outros fatores elencados pelo artigo de Alvarenga são a melhoria de indicadores socioeconômicos e a diminuição da desigualdade de IDH entre o centro e a periferia. O pesquisador também cita o aumento do policiamento ostensivo, estratégia de colocar os policiais fardados na rua, perto de pontos de alta criminalidade. O estudo, porém, não cita as mortes cometidas pela própria PM. Entre 1995 e 2015, foram 11.358 pessoas mortas pela polícia do estado.

Outro fator relevante apontado por Alvarenga é a redução demográfica dos jovens, o grupo mais vulnerável à mortalidade por homicídio. A parcela da população nessa faixa etária começou a diminuir antes em São Paulo do que nos outros estados, o que ajudaria a explicar a queda da violência chegando antes entre os paulistas.

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A análise estatística com múltiplas variáveis examinou 94 bairros do município de São Paulo entre 2000 e 2010. A conclusão do estudo de Alvarenga foi que os fatores mais relevantes para diminuir os homicídios foram as taxas de policiamento e a variação do IDH dos bairros, representando mudanças socioeconômicas.

Não dá para garantir, usando as estatísticas que temos, que a influência do PCC foi o principal fator para diminuir os homicídios em São Paulo. Mas dá para perceber a influência de políticas públicas na queda dos índices de violência, melhorando condições socioeconômicas e taxas de policiamento.

“No Brasil, em muitas unidades federativas se observam altas taxas de homicídios, e pouco se fala sobre as políticas públicas implementadas em SP como um possível modelo de resposta para o problema”, argumenta Bruno. Estudar mais o que foi feito no estado pode ser um caminho para diminuir a violência no resto do país.

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