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Cientistas identificam seis tipos de depressão usando neuroimagem

Psiquiatras da Universidade de Stanford usaram IA para encontrar padrões cerebrais em pessoas com depressão, o que pode facilitar o tratamento da doença.

Por Eduardo Lima
19 jun 2024, 19h00

Na abertura de Anna Karenina, o escritor russo Liev Tolstói escreve que “todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira”. A ciência moderna parece concordar com o autor, já que cientistas da Universidade de Stanford descobriram que a depressão ocorre de seis jeitos diferentes.

“A ideia surgiu há mais de 15 anos, observando a variedade de sintomas entre centenas de pacientes com transtorno depressivo maior”, conta a dra. Leanne Williams, autora sênior do novo estudo e uma das pioneiras da psiquiatria de precisão. Se os jeitos que a doença se manifesta são diferentes, será que existem tipos diferentes de depressão? E será que descobrir essas especificidades pode nos ajudar a encontrar tratamentos mais eficazes?

Ressonâncias magnéticas funcionais (RMF) em 801 pacientes com depressão revelaram seis subtipos da doença. As pessoas fizeram os exames de imagem enquanto estavam descansando e quando estavam realizando tarefas que testassem suas funções cognitivas e emocionais.

“Nós estamos buscando mudanças na atividade cerebral em regiões que envolvem a regulação cognitiva e emocional”, explica Williams. Os biotipos identificados têm diferentes perfis de atividade no cérebro e conectividade entre diferentes áreas do órgão. Cada um desses biotipos pode apresentar sintomas diferentes, que variam entre negatividade, anedonia (incapacidade de sentir prazer), ansiedade, ruminação de pensamentos negativos e dificuldade em administrar medos.

Essa é a primeira vez que se demonstra que a depressão pode ser explicada e mapeada por diferentes perturbações no funcionamento do cérebro – o que pode levar ao uso de métodos mais objetivos para tratar de cada caso subjetivo.

O estudo foi publicado no periódico Nature Medicine. O professor Pedro Shiozawa, do departamento de saúde mental da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e que não esteve envolvido no estudo, disse que a pesquisa é “extremamente significativa” para a área, permitindo “uma compreensão mais granular das variações na depressão”. 

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Para cada subtipo, um tratamento

Cerca de 30% das pessoas que sofrem com transtorno depressivo maior têm uma depressão resistente a tratamentos. Dois terços dos pacientes com a doença não conseguem reverter os sintomas completamente, mesmo com tratamento. 

Para o dr. Shiozawa, a falta de métodos precisos para determinar qual tratamento funcionará para um paciente específico é um dos principais desafios envolvendo a depressão. 

Os tratamentos são prescritos com base em protocolos clínicos que não levam em conta a individualidade de cada caso, seguindo um método de tentativa e erro que pode levar meses ou anos até acertar numa terapia que sirva para o paciente. Passar tanto tempo testando diversos remédios e linhas terapêuticas pode até piorar os sintomas da pessoa com depressão, que não vê melhora ou saída para sua condição.

Aqui está a maior importância prática do estudo de Stanford: os pesquisadores conseguiram conectar três biotipos aos tratamentos que podem ser mais ou menos adequados a eles. É uma abordagem mais objetiva e precisa, usando os exames de imagem do cérebro para chegar a uma intervenção mais eficaz de acordo com cada caso de depressão.

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Um dos subtipos, caracterizado por mais atividade nas regiões cognitivas do cérebro, reagiu melhor ao antidepressivo venlafaxina. No caso do biotipo com mais estimulação em três regiões cerebrais associadas à depressão e à resolução de problemas, a melhor forma de aliviar os sintomas foi terapia comportamental.

Já para os pacientes com um biotipo caracterizado por níveis menores de atividade no circuito cerebral que controla a atenção, a terapia falada era o método menos eficaz.

IA ajudando com diagnóstico mais “humanizado”

“Um paciente pode descrever seus sintomas, mas não pode determinar as mudanças cerebrais que estão por trás deles”, explica a dra. Williams. Essa forma mais objetiva de entender o subtipo do indivíduo pode ajudar cerca de 8% da população mundial que sofre com depressão. A doença, que afeta de jovens a idosos, é a principal causa de perda de produtividade no mundo, com quase US$1 trilhão de prejuízo anual para a economia global.

Para analisar os exames de ressonância magnética e identificar os subtipos de depressão, os pesquisadores usaram um programa de aprendizado de máquina baseado em análise de agrupamento de dados. As imagens de atividade cerebral eram analisadas por essa IA, que faz um agrupamento automático das informações de acordo com as semelhanças entre elas.

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Na Santa Casa, em São Paulo, tecnologias similares estão sendo usadas para auxiliar no diagnóstico e tratamento de transtornos mentais. Modelos de inteligência artificial de linguagem natural e de aprendizado de máquina são utilizados para analisar textos e outras fontes de informação dos pacientes, identificando características comportamentais e “padrões sutis que podem indicar risco de desenvolvimento de depressão”, explica o dr. Shiozawa.

Para o pesquisador, usar a IA de forma ética pode ser um jeito de “proporcionar um atendimento mais preciso e humanizado” para quem sofre com transtornos mentais. Williams diz que pretende continuar usando a inteligência artificial para refinar suas pesquisas e “descobrir novos biotipos” de depressão.

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