O Globo de Ouro foi “cancelado”. Saiba o que está acontecendo.
O canal NBC decidiu não transmitir a premiação em 2022, e o ator Tom Cruise devolveu os troféus que ganhou ao longo da carreira. Entenda como falta de representatividade e corrupção estão influenciando uma das maiores premiações do cinema.
O Globo de Ouro tem um longo legado de polêmicas, e quase todas giram em torno dos membros da Hollywood Foreign Press Association (HFPA), o seleto grupo de quase 90 pessoas responsável por escolher os indicados ao prêmio. Mas algumas histórias em 77 anos de premiação já mostraram que imparcialidade não é o forte de todos eles.
No início de 2021, por exemplo, a série Emily em Paris, da Netflix, foi indicada à estatueta de Melhor Comédia de TV. Apesar de ter atraído uma legião de fãs, a produção estrelada por Lily Collins (que também foi indicada como Melhor Atriz em Série de Comédia ou Musical) não teve tanta aclamação por parte da crítica especializada, o que tornou a indicação uma grande surpresa.
Pouco antes da cerimônia, o jornal americano Los Angeles Times revelou que 30 dos jurados da HFPA haviam sido convidados pela produção da série em 2019 para passar duas noites no hotel cinco estrelas Peninsula Paris, a fim de conhecer o set de filmagens na França. O “mimo” de milhares de dólares foi mal visto – muitos alegaram que isso pode ter influenciado as indicações.
O Los Angeles Times levantou ainda uma segunda polêmica: a pouca diversidade entre os membros da HFPA. Dos quase 90 jornalistas que compõem o grupo, nenhum é negro. Como se não bastasse, Philip Berk, ex-presidente da HFPA, foi expulso do cargo em abril após enviar um e-mail aos colegas descrevendo o Black Lives Matter como “um movimento de ódio racista”. Berk já havia sido acusado em 2018 de agredir sexualmente o ator Brendan Fraser, mas a HFPA permitiu que ele continuasse no grupo alegando que o episódio não teria passado de uma “piada mal compreendida”.
A falta de preocupação do Globo de Ouro frente aos temas de inclusão fez com que empresas como Netflix, Amazon Studios e WarnerMedia se recusassem a participar de eventos relacionados à premiação. Além disso, o canal NBC, que transmite o show desde 1996, comunicou que não irá exibir a premiação em 2022.
Muitos atores também apoiaram o boicote à HFPA. Scarlett Johansson, indicada a cinco Globos de Ouro, relembrou questões sexistas que enfrentou e comentários vindos de membros de associação que beiravam o assédio sexual. Mark Ruffalo escreveu em seu Twitter que era hora de intensificar e corrigir os erros do passado, dizendo ainda que não se sentia orgulhoso ou feliz pelo prêmio que recebeu neste ano (Melhor Ator em Minissérie ou Telefilme por I Know This Much is True). Já Tom Cruise foi além: o ator devolveu os três troféus que recebeu ao longo de sua carreira.
Plano de Reforma
Em meio a crise, o Globo de Ouro precisou se organizar. Na última segunda-feira (10), a HFPA apresentou um Plano de Reforma para a premiação. A associação colocou como meta adicionar pelo menos 20 novos membros até agosto de 2021. Além disso, pretendem aumentar em 50% o número de jornalistas dentro dos próximos 18 meses.
Também deverá ser contratado um consultor de Diversidade, Equidade e Inclusão, que terá como função conduzir treinamentos a respeito destes temas – e sobre assédio sexual – aos membros da HFPA. A associação promete ainda implementar novas políticas sobre presentes, viagens, conflitos de interesse e coletivas de imprensa.
Em comparação, o Oscar implementou novas regras de inclusão em setembro de 2020. A campanha #OscarsSoWhite (Oscar Tão Branco) ganhou força em 2016, quando nenhum nenhum ator ou atriz negro(a) ou latino(a) foi indicado às principais categorias. Desde então, a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (Ampas), responsável pelo prêmio, passou a rever antigos conceitos e desenvolveu uma série de regras que abordam a diversidade dos filmes – na frente e atrás das câmeras.
As novas diretrizes entrarão em vigor nos próximos anos, e você pode entender todas elas nesta reportagem da Super. O números de votantes da Ampas, vale ressaltar, é cem vezes maior que o da HFPA: mais de 9 mil pessoas.
Apesar do anúncio, o plano de reforma não foi amplamente bem recebido. A Time’s Up, instituição de caridade que arrecada dinheiro para apoiar vítimas de assédio sexual (e importante defensora da reforma da indústria do entretenimento nos EUA), por exemplo, não se sensibilizou com as mudanças propostas pelo Globo de Ouro. Para ela, as promessas são apenas “de fachada”.
Ao longo dos anos, a premiação precisou se reinventar diversas vezes para lidar com polêmicas e acusações de corrupção. Resta aguardar para saber se as novas mudanças, de fato, surtirão efeito.