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Museus adaptados: Belas-artes para cegos

Recentemente, na Europa, surgiram dois museus para pessoas com deficiência visual. Com a ajuda de bengalas eletromagnéticas e de pisos especiais, os visitantes se orientam entre maquetes de monumentos e até esculturas de artistas consagrados.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h46 - Publicado em 30 jun 1993, 22h00

Logo na bilheteria, o cobrador solícito entrega o ingresso com inscrições em braile; ele oferece também o livreto, escrito da mesma maneira, que serve de guia para o passeio. Nesse ponto, a recepção no Museu de Belas-Artes de Nice, na França, e no Museu dos Cegos de Madri, na Espanha, é muito semelhante. Inaugurados no final do ano passado, ambos se dedicam ao público com deficiência visual. A diferença é que o museu espanhol exibe peças criadas especialmente para pessoas cegas, enquanto quem visitasse o museu de Nice, no mês passado, poderia observar o trabalho de dois dos maiores mestres da escultura mundial, os franceses Jules Carpeaux (1827-1875) e Auguste Rodin (1840-1917). Os dois locais, porém, misturam arte e tecnologia, para atender àquelas pessoas impossibilitadas de enxergar.

Até a arquitetura do museu de Madri foi projetada no sentido de facilitar a visita dos deficientes visuais. Ali, eles dispõem de 40.000 livros em braile, 60.000 trilhas sonoras e 5.000 trabalhos de arte, que incluem, por exemplo, maquetes de edifícios históricos das cidades mais famosas do mundo. Para que os visitantes se orientem pelos corredores, os arquitetos colocaram materiais diferentes nos pisos das salas – assim, graças aos sons produzidos pelas passadas, os cegos podem saber se, por engano, estão entrando em um local já visitado. A iluminação ambiente e as cores das paredes foram escolhidas criteriosamente, no sentido de ajudar as pessoas com cegueira parcial.

Entre as peças expostas mais curiosas estão miniaturas de monumentos, como a Estátua da Liberdade, símbolo máximo de Nova York, nos Estados Unidos. Há, ainda, um mapa da Espanha em alto-relevo, criado em 1879, com os nomes das cidades em braile. Entre as maquetes, destaca-se a cidade velha de Jerusalém, em Israel. Os visitantes passeiam com as mãos pelas pequenas ruas, recriadas em madeira. Quando a ponta do dedo para em algum local, uma gravação é acionada, informando onde ele se encontra naquele instante. Para completar a atmosfera, aparelhos especiais liberam odores típicos da cidade israelense.

A construção de um museu como esse era uma antiga idéia da Organização Nacional dos Cegos da Espanha que, ao contrário de outras instituições do gênero, sobrevive à própria custa. Trata-se de uma das dez maiores empresas do país, que movimenta algo em torno de 3 bilhões de dólares anuais, controlando jornais e até a loteria madrilena. Já o Museu de Nice foi desenvolvido com a ajuda do governo francês. No início do ano passado, o Ministério da Educação e Cultura, da França, criou um concurso com o slogan “Crie um museu para cegos”. Venceu a Secretaria de Turismo de Nice. O maior investimento – em torno de 300.000 dólares – foi para a instalação de faixas eletromagnéticas nos corredores.

Mal chega, o visitante do Museu de Nice recebe uma bengala especial, que é atraída pela faixa magnética. Quando deseja tocar em algum objeto e se afastar da faixa, a pessoa simplesmente desliga um interruptor. Ao liga-lo novamente, a bengala passa a captar um sonar. Assim, o ruído vai ficando mais forte, à medida que a pessoa se aproxima da faixa, para retomar a caminhada. Os franceses, no entanto, ainda não estão satisfeitos. O museu mantém convênio com laboratórios , para aperfeiçoar ainda mais suas instalações. Até o final do ano, as bengalas – que hoje pesam 280 gramas – devem ficar um quarto mais leves, graças à pesquisa de novos materiais. Os cientistas envolvidos com o museu também se preocupam em desenvolver luvas especiais, que não eliminam totalmente a sensação tátil, mas ajudam a proteger obras mais frágeis, que hoje em dia não podem ser tocadas pelos deficientes visuais, por motivos de segurança.

A maioria dos museus franceses dá permissão a pessoas cegas que toquem esculturas maiores ou menos frágeis, que se encontram fora de redomas. Calcula-se que 1% dos franceses sejam deficientes visuais; a mesma porcentagem, aliás, de outros países avançados, como Estados Unidos e Japão. De acordo com dados da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, a incidência de cegueira no Brasil parece ser ligeiramente maior, ficando por volta de 1,5%. Uma provável explicação para essa diferença é a falta de campanhas de prevenção. Em mulheres no início de gravidez, algumas doenças infecciosas podem provocar a cegueira do bebê. O problema seria evitado com a ajuda de vacinação adequada. Os deficientes visuais brasileiros também não recebem o mesmo apoio que vêm recebendo os europeus: não existem projetos de museus especializados para essa população. A única iniciativa semelhante que se tem notícia, segundo a Fundação para o Livro do Cego no Brasil, é a do Liceu de Artes e Ofícios, em São Paulo. Ali, ao menos, já existem guias de visitantes, escritos em braile.

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