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O que é mais eficaz: ir ao psicólogo ou tomar remédio?

No Brasil e nos EUA, as pessoas estão fazendo menos sessões de terapia e recorrendo mais aos antidepressivos. Mas será que isso é uma boa opção?

Por Sandra Chelmicki
14 jun 2018, 16h46

De um lado do ringue, um divã, um terapeuta e semanas, meses, anos de muita conversa. Do outro, uma pílula que pode acabar com os problemas rapidamente. Nessa luta, a medicação vem ganhando pontos. Uma pesquisa americana publicada em 2011 concluiu que menos de um terço das pessoas em tratamento com um antidepressivo consultaram um psicólogo ou psiquiatra ao longo de um ano. Entre aquelas que tomavam mais de um antidepressivo, menos da metade compareceu a uma consulta. O estudo realizado pelo Centers for Disease Control and Prevention analisou dados de 2005 a 2008 e indicou, ainda, que 11% dos americanos com idade acima de 12 anos tomavam antidepressivos.

Ainda nos Estados Unidos, outro estudo, da Medco Health Solutions, avaliou as receitas de mais de 2 milhões de americanos em relação ao uso de antidepressivos, antipsicóticos, remédios para déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) e ansiolíticos, entre 2001 e 2010. O relatório America’s State of Mind indicou crescimento no número de americanos com transtornos psicológicos e de comportamento tratados com medicação: mais de 20% dos adultos estavam usando pelo menos um dos remédios incluídos no estudo. Em relação ao período entre 1991 e 2000, um aumento de 22%.

A tendência é a mesma no Brasil. Entre 2010 e 2014, por exemplo, a venda de anticonvulsivantes e de antidepressivos e estabilizadores do humor aumentou cerca de 25 e 58%, respectivamente. Os dados são da IMS Health Brasil, que pesquisa informações do setor da indústria farmacêutica. No caso dos anticonvulsivantes, entre eles o Rivotril, a venda passou de 40 milhões de unidades para 50 milhões. Já a comercialização de antidepressivos e estabilizadores de humor, como o Amytril, saltou de 29 para 46 milhões, enquanto a de antipsicóticos, como o Haldol, passou de 12,6 para 16 milhões.

Em níveis mundiais, o Brasil está em quarto lugar no consumo de estimulantes – remédios usados no tratamento da obesidade e do TDAH –, ficando atrás apenas de Estados Unidos, Argentina e Alemanha. Mas o que todos esses números sugerem? O aumento do consumo de psicotrópicos, ao menos nos Estados Unidos, está implicando uma queda no tratamento combinado com psicoterapia, conforme o estudo do Centers for Disease Control and Prevention.

O paciente está cada vez mais impaciente: quer rapidez no tratamento, praticidade e redução dos gastos – é preciso levar em consideração o alto custo das sessões de psicoterapia.

O mau uso dessas medicações também deve ser considerado no aumento do consumo. Não é raro, por exemplo, o caso de estudantes que usam estimulantes “emprestados” do colega para aumentar seu desempenho em dia de prova. Outro viés desse mau uso das medicações psicotrópicas é a intolerância das pessoas a momentos de infelicidade ou de tristeza. Situações que são esperadas na vida de qualquer um, mas cada vez mais administradas com remédios que, no fim das contas, podem não ter nenhum efeito ou serem prejudiciais. Mas não é só isso: há também um universo de pacientes que não tinham diagnóstico correto e que hoje fazem uso de medicação. É o caso do déficit de atenção em adultos, uma doença que não era muito diagnosticada nessa faixa etária.

As indicações terapêuticas alternativas dos remédios já existentes e a introdução de novos medicamentos no mercado também influenciam a ascensão do uso de psicotrópicos. Antidepressivos e ansiolíticos são receitados, cada vez mais, para mulheres que sofrem de TPM ou estão na menopausa. A dapoxetina, pertencente à mesma classe da fluoxetina, foi desenvolvida inicialmente como um antidepressivo e é usada para tratamento da ejaculação precoce masculina.

Porém, antes da dapoxetina e de outras novidades que prometem trazer a cura ou o controle de sintomas com menos efeitos colaterais, é preciso lembrar como essa revolução começou. No final da década de 1980, chegava ao mercado a pílula da felicidade, o Prozac (fluoxetina), que transformaria radicalmente o tratamento da depressão ao reduzir os efeitos colaterais em relação aos remédios existentes. Seu sucesso estimulou o surgimento de drogas semelhantes no mercado, como os antipsicóticos atípicos (risperidona), que puderam tratar o cérebro em si.

Desde o desenvolvimento do Prozac até hoje, há um capítulo importante nessa história: a década de 1990 nos EUA foi marcada por investimentos em pesquisas e no desenvolvimento de novas tecnologias para a investigação e o tratamento de doenças mentais. A partir de então, a ressonância magnética e a tomografia aperfeiçoaram o mapeamento das áreas cerebrais, um salto para as neurociências. E para a produção de mais medicamentos, claro.

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Mais médicos 

Outro ponto importante na evolução do consumo dos psicotrópicos é a prescrição feita por médicos de diversas especialidades. Embora não haja dados oficiais, é ponto pacífico entre os especialistas que quem mais prescreve antidepressivos no mundo e no Brasil não são os psiquiatras, mas o conjunto das outras especialidades médicas. Um relatório da Anvisa, de 2009, indica esse desvio, já que uma grande quantidade de remédios para emagrecimento, por exemplo, é receitada por não especialistas. No levantamento, há, entre os maiores prescritores do Brasil, um especialista em medicina do tráfego, um ginecologista, um dermatologista e um pediatra.

Algumas doenças, como déficit de atenção, esquizofrenia e transtorno bipolar, têm sido comumente tratadas apenas com medicação. No entanto, a associação dos remédios à psicoterapia é recomendada pela maioria dos profissionais. “Alguma modalidade de terapia sempre é importante, nem que seja para a psicoeducação do paciente com relação ao tratamento. Em alguns quadros de fobia, nos quais a medicação praticamente não tem efeito, e de transtorno do pânico, ela é essencial”, diz o psiquiatra e coordenador da revisão técnica do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), Aristides Volpato Cordioli. “Há uma cultura contemporânea que prioriza o excesso de medicações e a rapidez dos tratamentos”, afirma o psiquiatra e psicanalista Celso Gutfreind.

Psiquiatria ou psicologia?

Escolher um psicólogo ou um psiquiatra para tratar dos males do psíquico ainda é uma decisão complicada. O tratamento combinado, quando o psiquiatra prescreve a medicação e conduz a psicoterapia, é uma tentativa de integrar o conhecimento das duas áreas de uma forma prática e econômica para o paciente e é aprovada por muitos especialistas. Alguns o consideram inviável, no entanto, pois a psicoterapia não costuma ser o foco do trabalho do psiquiatra.

Para Luís Fernando Tófoli, psiquiatra e professor da Unicamp, ainda há um agravante nessa relação: a tentação de buscar a alteração de um estado emocional do paciente com mudanças na medicação pode ser frequente quando quem prescreve também é aquele que ouve. “Em casos menos complexos, é aceitável que o psiquiatra com treinamento em psicoterapia assuma o papel de terapeuta. Mas não é o ideal”, diz.

A história das descobertas da psicanálise, dos psicofármacos e da própria neurociências mostra que, se há um período inicial de entusiasmo com cada técnica, os esforços acabam sendo unidos com o tempo. “Se considerarmos que o ser humano, em sua saúde e doença, é amplo demais para ser abarcado por um só ramo da ciência, qualquer separação em um tratamento faria dele algo incompleto”, avalia Celso Gutfreind. Já para Cordioli, o melhor remédio ainda é o profissional interessado em ouvir e tratar o paciente – seja lá qual for a sua especialidade.

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Efeito placebo supera antidepressivos

Um grupo de controle toma a droga a ser testada. Outro recebe pílulas idênticas sem efeito farmacológico. No final, pelo menos 30% dos pacientes do segundo grupo relatam alívio dos sintomas: tudo porque acreditam que o medicamento era de verdade. No jargão médico, é o efeito placebo.

Exemplo do efeito placebo pode ser encontrado na metanálise do psicólogo Irving Kirsch (Listening to Prozac but Hearing Placebo), publicada em 1998, em uma revista da Associação Americana de Psicologia. Na pesquisa, concluiu-se que 25% da melhora obtida com antidepressivos está associada à substância ativa do remédio. O restante deve-se ao efeito placebo e, em menor escala, à evolução da doença.

O sucesso no tratamento da depressão grave com medicação, no entanto, é reconhecido pela maioria dos profissionais de saúde, incluindo o próprio Kirsch. Para quadros mais leves da doença, a psicoterapia, especialmente a cognitivo-comportamental, é tão ou mais eficiente que os remédios.

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