Precisamos falar sobre modelo de negócios (para salvar o jornalismo)
2013 foi um ano duro para os jornalistas no Brasil, assim como os últimos anos vem sendo duros para os jornalistas ao redor do globo. Da chamada mídia tradicional (Estadão, Folha, Abril, etc) aos veículos “alternativos” (como as revistas Caros Amigos e Trip), quase todas as empresas de jornalismo impresso fizeram demissões em massa que resultaram em centenas de profissionais desempregados. De maneira geral, a crise é explicada assim: com a popularização da internet e da banda larga, a grande maioria das pessoas têm deixado de assinar jornais e revistas para se informar através de portais, blogs e redes sociais – como o Facebooke e Twitter. No entanto, o dinheiro de publicidade que é gasto nos veículos de jornalismo digital ainda não é o mesmo que o que era gasto nos veículos de jornalismo impresso e – até agora – poucas pessoas parecem dispostas a pagar por conteúdo online. Até agora.
Dia primeiro de agosto, o New York Times abriu os números de seu faturamento digital. Seu site trouxe 200 milhões de dólares de receita de publicidade (que se mantém estável) e um crescente montante de 150 milhões de dólares de assinaturas digitais (número que deve se igualar aos 200 milhões de publicidade em breve, com o lançamento de assinaturas digitais para novos produtos ). Quando o mais importante jornal do mundo abre seus números e revela que já ganha com assinaturas digitais quase o mesmo que com publicidade ele aponta que, sim, existem pessoas interessadas em pagar por bom conteúdo digital. Como explica Rafael Kenski – novo redator-chefe digital das marcas jovens e masculina da Editora Abril – “Existe um vácuo de boas histórias, de reportagens e contextualização. Ninguém entende o que está acontecendo e está disposto a pagar para quem explique. As experiências das empresas de jornalismo digital bem sucedidos – como Buzzfeed, Huffington Post e o The New York Times – mostram que dá para manter uma boa redação (ainda que menor) só com a receita dos meios digitais.” Podemos acrescentar a essas três marcas citadas por Kenski, os números do tradicional tablóide britânico Daily Mail que comemora o crescimento de 41% em sua publicidade online. Crescimento que já é capaz de segurar a queda de publicidade de sua versão impressa.
A busca por novos modelos de negócios – e as consequentes comemorações de bons resultados – não se restringem aos veículos tradicionais de mídia. Nos EUA, o agregador de blogs Huffington Post já tem audiência equivalente ao New York Times e conta com mais de duas centenas de empregados – além de já ter abocanhado o prestigiado Prêmio Pulitzer, em 2012. O Buzz Feed é outra marca surgida na internet – e já estabelecida no mercado – que revolucionou a forma de criar conteúdo online (colocando lado a lado matérias de política e listas de meme cheias de gifs) e tem experimentado formatos de publicidade agressivos (publieditorais) que misturam conteúdo editorial com anúncios. No Brasil, os protestos de junho revelaram a iniciativa do “Mídia NINJA” formado por uma dezena de voluntários que cobre os protestos munidos apenas de smartphones com conexão 3G. Polêmicas sobre suas ligações com o Fora do Eixo à parte, o Mídia NINJA propõe quatro alternativas de pagamento por conteúdo digital que viabilizem suas atividades: crowdfunding (financiamento coletivo), um sistema de assinatura mensal, doações para grandes reportagens específicas e uma microdoação que funcionaria como um botão de like e iria direto para o autor da matéria. Procurado para contar suas história nesse artigo, Bruno Torturra (criador do Mídia NINJA) topou a entrevista, mas acabou não enviando suas respostas.
André Deak, jornalista independente que dá aulas de jornalismo digital e participa do coletivo Casa de Cultura Digital, aponta outras experiências de “novo jornalismo” que tem dado certo: “Fora do Brasil existem o Media Storm, o ProPublica e El Diario.es, na Espanha, que trabalha só com doação dos leitores.” Ele, assim como Bruno Torturra, vê com olhos otimistas a atual crise pela qual o jornalismo brasileiro tem passado: “Talvez, sem a mídia tradicional, a gente se obrigue a buscar formas mais criativas de fazer jornalismo de qualidade, de sustentar essas iniciativas. Inclusive com recursos públicos, por que não? Editais públicos de grandes reportagens. Edital tem problemas, claro. Mas vamos tentar novos caminhos, quem sabe a gente encontra.“
O que parece claro aqui é a necessidade urgente de pensar novos modelos de negócio (assinaturas digitais, publieditoriais, financiamento coletivo, etc) que sustentem o bom jornalismo online e que permitam a criação de grandes reportagens e modelos inovadores como data visualization e newsgames (jogos jornalísticos). Grande parte dessa responsabilidade tem ficado na mão dos empresários do meio, mas deveria passar pela cabeça dos jornalistas também. Cursos e cadeiras de jornalismo “empreendedor” tem se tornado mais comuns nos EUA e a o lema do “faça você mesmo” foi o que moveu diversos dos blogs e sites pioneiros que hoje já se sustentam produzindo conteúdo no Brasil. Tanto as formas de conteúdo (jornais e revistas ainda têm se diferenciado pela qualidade e exclusividade de suas matérias?) quanto as formas de trazer receitas devem ser repensadas. Muitos dos caminhos para “salvar” o jornalismo ainda estão abertos e inexplorados, e essa é a parte divertida da coisa.