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Existe um único lugar em que plantar mais árvores não é uma boa ideia: o Ártico

Existe mais carbono nos solos do Ártico do que em todas as árvores do mundo juntas — incluindo nas famigeradas florestas tropicais. Para ele permanecer lá, porém, precisamos de gelo, não mato.

Por Manuela Mourão
Atualizado em 6 jan 2025, 14h02 - Publicado em 6 jan 2025, 14h00

Qualquer aula no ensino fundamental te ensina que uma das soluções para o aquecimento global é plantar mais árvores — e é disso que grandes indústrias também tentam te convencer, já que distribuir sementes por aí sai bem mais em conta do que reduzir emissões de carbono.

Mas essa não é uma verdade universal: impor reflorestamento com grandes árvores na região do Ártico — o que pode soar razoável diante do derretimento do gelo por lá — na verdade é uma péssima ideia.

Isso é culpa de algo chamado albedo (ou coeficiente de reflexão): a quantidade de radiação solar que é refletida pela superfície terrestre e volta para o espaço.

No Ártico, o tipo de vegetação mais comum é a tundra, que consiste em arbustos e gramíneas baixas e esparsas e fica coberta por neve durante grande parte do ano. Por ser branca, a neve reflete três quartos da energia solar que recebe, o que faz com que as regiões mais geladas do globo tenham um albedo alto.

É diferente para quem mora nas regiões tropicais. Florestas fechadas, cidades muito asfaltadas e até o próprio oceano são lugares com baixo albedo, por serem mais escuros. É só pensar em um carro preto parado em um estacionamento descoberto: ele absorve um bocado de calor, e você sente aquela bufa desagradável ao abrir a porta. 

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Plantar muitas árvores altas no Ártico tamparia o cobertor de neve da superfície, geraria mais sombras e reduziria o albedo, o que aqueceria ainda mais a Terra. Isso aconteceria mesmo com as árvores absorvendo CO2.

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Essa é apenas uma face da moeda que foi apresentada em um estudo publicado na Nature Geoscience. Os autores, Marc Macias-Fauria e Jeppe Aagaard Kristensen, escrevem para o The Conversation que, como a maior parte do carbono no Ártico está no solo, “o cultivo de árvores no Ártico poderia causar a liberação de parte desse carbono.” 

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E seria carbono para caramba: de acordo com estudos anteriores, existe mais carbono nos solos do Ártico do que em todas as árvores do mundo juntas — incluindo nas famigeradas florestas tropicais. 

O problema de forçar um reflorestamento na área é que árvores em crescimento liberam açúcar pelas raízes, o que já é suficiente para fornecer energia aos micróbios, permitindo que eles decomponham parte do carbono acumulado no solo ao longo de milênios. Esse processo é conhecido como efeito priming.

“O resultado inevitável de um projecto de florestação no Árctico são décadas de libertação de grandes quantidades de carbono do solo para a atmosfera. Esta é uma contribuição inaceitável para os gases com efeito de estufa atmosféricos no período em que mais necessitamos de reduções”, escrevem os autores.

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Sem contar os desafios que já enfrentam as árvores que habitam a floresta de neve: elas são vulneráveis a incêndios intensos, pragas e ao clima extremo, que periodicamente destrói toda a vegetação. Além disso, plantar novos exemplares seria um problema para os ecossistemas já existentes e as populações tradicionais. 

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