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Encontrado segundo exemplar de espécie de perereca extinta, uma das mais raras e enigmáticas do mundo

O frasquinho encontrado em uma coleção antiga do Museu de Zoologia da USP revoluciona o que se sabe sobre a perereca-de-fímbrias.

Por Bela Lobato
24 out 2024, 18h00

A Phrynomedusa fimbriata é uma das espécies mais raras do mundo. Essa pequena perereca, com menos de cinco centímetros, foi avistada e coletada uma única vez, no Vale do Paranapiacaba, em São Paulo, em 1898. Apesar da região ser muito estudada por biólogos, desde então, ninguém nunca mais encontrou outro espécime, e a espécie foi declarada extinta em 2004. 

Agora, um achado no fundo de uma prateleira do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo revolucionou tudo que se sabe sobre esse animal – e pode influenciar os esforços de conservação no sul de São Paulo.

“Como muitas coisas da vida, foi por acaso. Estava trabalhando em uma coleção de herpetologia, mas não estava procurando por ele”, conta o pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro José Pombal Jr., sobre o momento em que encontrou um vidrinho na coleção que pertenceu ao zoólogo brasileiro Werner Bokermann. “Aí apareceu esse indivíduo muito estranho, que imediatamente chamou minha atenção. Por um momento, acreditei que seria mais provável que fosse uma espécie não descrita do que a própria espécie desaparecida há tanto tempo.”

Foto do Perereca-de-Fímbrias.
Até então, esse era o único exemplar conhecido da perereca-de-fímbrias. Ele é chamado de holótipo, nome dado ao espécime que é utilizado para descrever uma nova espécie. (Délio Baêta/Museu de Zoologia da USP/Reprodução)

Ele, então, convidou Délio Baêta, um pesquisador que já havia trabalhado em conjunto com ele numa pesquisa de doutorado sobre o gênero Phrynomedusa. Os dois conduziram uma análise taxonômica minuciosa para determinar a espécie do achado, e concluíram que era mesmo um segundo exemplar da P. fimbriata, que também é conhecida como perereca-de-fímbrias.

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Délio, que é pesquisador associado ao CBioClima da Universidade Estadual Paulista e ao Museu Nacional da UFRJ, entrou em contato com museus de todo o mundo para confirmar se ninguém mais tinha, por acaso, outro espécime daquela mesma perereca. E comprovou: era mesmo a segunda vez que aquele animal era encontrado e registrado. 

Apesar do animal em si estar em bom estado de conservação, o frasco não tinha muitas das informações que são importantes para os pesquisadores. Eles precisam saber, por exemplo, o local específico da coleta, o tipo do corpo d’água presente, onde exatamente o animal estava (se era em uma árvore ou numa poça, por exemplo) etc.

O vidrinho apenas carregava uma etiqueta que dizia “Serra do Araraquara, Paraná”, sem informações sobre quando ou por quem foi coletado. “Provavelmente alguém – um amigo ou um outro zoólogo – pegou o animal no Araraquara, e, sabendo dessa coleção particular  do Bokermann, enviou o bicho. O nosso trabalho de revisão da coleção se assemelha a um trabalho de detetive”, diz Baêta.

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Foto do Dr. Délio Baêta analisando um frasco com exemplares de Phrynomedusa.
Délio Baêta, pesquisador associado ao Museu Nacional, analisa um espécime da terceira maior coleção de anfíbios do Brasil, na Universidade Estadual de São Paulo. (Délio Baêta/Museu de Zoologia da USP/Reprodução)
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De acordo com diários de Bokermann, o administrador da coleção, os dois concluíram que ele deve ter recebido essa amostra em algum momento entre 1950 e 1960. Isso implica em duas coisas bombásticas: a primeira é que o local da segunda coleta foi a 350 quilômetros de distância do achado original; a segunda, é que a data é muito mais recente do que a do espécime original, de 1898. 

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Essas duas informações mudam tudo que se entende sobre a distribuição geográfica dessa espécie que eles consideram “uma das mais enigmáticas da Mata Atlântica”.  Os resultados da pesquisa foram publicados na edição de outubro da revista Ichthyology & Herpetology.

Agora, estão renovadas as expectativas de encontrar a perereca-de-fímbrias em algum outro de São Paulo e ou do Sul do Brasil. “Para mim, que sou otimista, abre uma possibilidade gigantesca na busca dessa espécie”, diz Baêta.

As expedições já conseguiram financiamento e estão preparando os trâmites legais, mas os pesquisadores dizem que as buscas devem ser como procurar por agulha no palheiro. “Estamos falando de pererecas que podem passar a vida inteira numa bromélia no alto da árvore sem descer para reproduzir. Não é como se a gente estivesse procurando um elefante na mata”, diz Baêta, rindo.

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Foto do José Pombal.
José Pombal Jr., curador das coleções de Anfíbios do Museu Nacional, em trabalho de campo para coleta de animais. (Délio Baêta/Reprodução)

A mudança da abrangência territorial da perereca-de-fímbrias pode fortalecer, inclusive, o processo que tenta transformar a área onde o segundo espécime foi encontrado em uma unidade de conservação ambiental. Essa informação chegou aos pesquisadores através de colegas nos últimos dias, e ainda não foi confirmada. “Isso mostra como tudo está conectado: aquele bichinho morto há tantos anos, na verdade, tem uma importância aplicada: se soma a mais um esforço de preservação”, diz Pombal Jr.

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