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DNA revela origem de misterioso macaco jamaicano extinto

Conheça a história do Xenothrix: um easter egg da seleção natural que flutuou da Amazônia para a Jamaica – e lá foi de macaco a bicho-preguiça.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
15 nov 2018, 16h08

“17 de janeiro. Passei o dia todo na caverna de Long Mile e consegui alguns bons ossos. Meus achados mais importantes foram a mandíbula inferior e o fêmur de um pequeno macaco, encontrado em detritos de calcário amarelo. Eles não estão associados aos restos humanos, mas não estão tão longe deles. O animal não é um forte candidato a ser uma espécie introduzida. Ele estava enterrado mais fundo que os ossos humanos (…)”

Essas são anotações do naturalista Harold E. Anthony, famoso por ter investigado a biodiversidade do Caribe na década de 1920 a serviço do Museu Americano de História Natural. Explorando a caverna jamaicana mencionada no texto, ele encontrou ossos que hoje sabemos pertencer a um bichinho misterioso: o macaco Xenothrix mcgregori, que tinha características anatômicas exóticas e não se parecia com nenhum outro primata conhecido.

Os ancestrais do mcgregori fixaram residência na Jamaica há 11 milhões de anos. Isso é razoavelmente antigo. Para fins da comparação: nessa época, a linhagem que daria origem ao Homo sapiens ainda não havia se separado da dos chimpanzés (o que só ocorreria há algo entre 5 e 7 milhões de anos) ou sequer da dos gorilas (8 milhões de anos).

Chegando à terra de Bob Marley, os macacos se modificaram rapidamente. Ilhas são ótimos laboratórios para a seleção natural. Populações pequenas e isoladas, expostas a condições de sobrevivência diferentes das habituais, sofrem muito mais pressão para se adaptar aos novos desafios. O exemplo mais famoso desse fenômeno são os tentilhões do arquipélago das Galápagos: em cada ilha, seus bicos têm a forma ideal para consumir um tipo de alimento.

Embora a história seja uma favorita dos professores de ensino médio nas aulas sobre Darwin, a verdade é o que o britânico não teve o insight da seleção natural observando esses pássaros. Só percebeu a importância dos bicos especializados muito depois da viagem, quando levou exemplares para um amigo da Sociedade Zoológica de Londres (ZLS), John Gould, analisar.

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X. mcgregori
A mandíbula do macaquinho fantasma. (Siobhan Cooke, Johns Hopkins Medicine/Divulgação)

O primata jamaicano, à maneira dos tentilhões, sofreu transformações anatômicas únicas. Por isso, a identidade de seus ancestrais foi desconhecida por vários anos. Ele tinha um número incomum de dentes, se pendurava nas árvores como um bicho-preguiça (inclusive na velocidade) e tinha pernas similares às de um roedor. Biólogos debatiam ferozmente sua classificação: ele era um macaco sem família na árvore da vida.

Era impossível investigar espécimes vivos, porque Xenothrix foi extinto em algum momento entre os anos 600 e 900, quando os primeiros nativos americanos aportaram na Jamaica. Mesmo que eles não tenham caçado diretamente os macacos, a agricultura e a introdução de espécies de outros lugares desequilibraram o ecossistema. Os europeus, que só chegariam por lá em 1494, não conheceram o bicho.

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Agora, uma análise de traços de DNA extraídos dos ossos resolveu o problema: o Xenothrix é descendente dos macaquinhos titis amazônicos (um grupo que inclui espécies de nome divertido, como os guigós e os zogue-zogues). Provavelmente flutuando num belo toco de árvore, eles foram arrastados até a foz de algum rio amazônico e então ejetados em mar aberto. Colonizaram a Jamaica e, após alguns bons milhares de anos, se tornaram irreconhecíveis.

“O DNA antigo indica que o macaco jamaicano é só mesmo um macaco titi com algumas características morfológicas diferentes, e não um ramo completamente novo de macaco do Novo Mundo”, explicou em comunicado Ross MacPhee, do setor de mamíferos do Museu Americano de História Natural. “A evolução pode agir de jeitos inesperados em ilhas, produzindo elefantes miniatura, pássaros gigantes e, veja só, um primata com jeito de bicho-preguiça (…)”

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