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Crise climática torna Atlântico mais ácido e ameaça corais brasileiros

Pesquisa brasileira expõe os riscos que essa mudança oferece à Amazônia Azul, uma porção de água rica em recursos naturais e em sua biodiversidade.

Por Caio César Pereira
3 jul 2024, 10h22

Quando se trata de notícias e pesquisas sobre como as mudanças climáticas estão afetando o planeta, nada é ruim o suficiente que não possa piorar. Prova disso é um novo estudo realizado por cientistas brasileiros, que descobriu que uma parte das águas do oceano Atlântico Tropical está se tornando cada vez mais ácida – afetando, assim, todo o ecossistema marinho da região.

A pesquisa analisou dados relativos à temperatura e à salinidade da superfície do mar, coletados entre os anos de 1998 e 2018. Os resultados, publicados no dia 30 de junho na revista Frontiers in Marine Science, revelam que o aumento da acidez no Atlântico Tropical acontece graças a concentrações maiores de gás carbônico (CO₂) no mar.

Quanto mais emissões de CO2 na atmosfera, maiores serão as concentrações nos oceanos (que cobrem 71% do planeta), já que o gás é dissolvido na água. Uma vez nos mares, ele reage com as moléculas de água e desencadeiam um efeito dominó. Formam-se a partir daí ácido carbônico e íons hidrogênio [H+], que causa o fenômeno da acidificação, alterando vários processos químicos na água do mar. 

“Os oceanos têm uma certa capacidade de manter seu pH estável por conter diversos sais dissolvidos que reagem e neutralizam essa entrada de ácido”, explica em entrevista a Super Carlos Musetti, um dos autores do artigo e pesquisador do instituto alemão GEOMAR Helmholtz Centre for Ocean Research Kiel. “No entanto, esse potencial de neutralização do oceano é limitado – e, com as emissões aumentando vertiginosamente como observamos hoje em dia, o oceano acaba sim sofrendo acidificação devido ao aumento nas concentrações de CO₂  na atmosfera”, complementa.

O aumento da concentração de CO2 (um gás de efeito estufa, lembre-se) na atmosfera, claro, tem dedo humano, mesmo com todos os protocolos ambientais para a sua redução. No ano passado, por exemplo, o mundo bateu um recorde na emissão de gás carbônico para a produção de energia: 37,4 bilhões de toneladas.

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O novo estudo mostrou que, ao longo de 20 anos, enquanto a concentração de gás carbônico no Atlântico Tropical aumentou em quase 10%, o pH da água diminuiu aproximadamente 0,001 unidades por ano, uma queda de cerca de 0,4%. De acordo com Letícia Cotrim, pesquisadora do Laboratório de Oceanografia Química da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e uma das autoras do estudo, essa é uma tendência que já vem sendo observada em outros lugares dos oceanos.

“Estas tendências estão muito próximas ao que já se sabe que vem acontecendo em outras regiões do oceano, ou seja, é mais uma evidência do efeito das emissões de gás carbônico feitas pelo homem (dentre os outros gases de efeito estufa)”, diz Cotrim. “Além da mudança climática, afeta a química dos oceanos. Pode parecer pouca coisa, mas qualquer alteração já é significativa.”

E como isso afeta os corais?

Esse aumento da acidificação do oceano, claro, tem um grande impacto no ecossistema marinho. O oceano Atlântico Tropical é onde fica localizada a chamada Amazônia Azul, área marítima brasileira cujo tamanho equivale a 67% do nosso território terrestre. Essa região é rica não somente por conta de suas reservas de recursos naturais, como petróleo e outros gases, mas também por conta de sua biodiversidade – ameaçada pelo aumento da acidificação.

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“Com a diminuição do pH, a concentração dos íons carbonato na água do mar diminui, o que afeta diretamente os organismos marinhos que produzem exoesqueletos e conchas de carbonato de cálcio, como os corais, os moluscos bivalves e gastrópodes, e as algas calcárias, incluindo organismos fito e zooplanctônicos, estes últimos na base da cadeia alimentar do oceano,” conta Cotrim. 

“A acidificação impacta principalmente na base das cadeias alimentares na Amazônia Azul, uma vez que impacta organismos como corais, algas e o plâncton marinho”, complementa Musetti. “Com isso, organismos maiores acabam tendo limitações de alimento devido a esses impactos gerados pela alteração na química da água do mar. Como mencionado anteriormente, os corais têm seus esqueletos enfraquecidos e, por isso, ficam frágeis e susceptíveis a doenças e outros impactos.”

Os dados analisados na pesquisa foram obtidos graças às boias de observação do projeto PIRATA (Prediction and Research moored Array in the Tropical Atlantic, ou Previsão e Pesquisa ancoradas no Atlântico Tropical). O projeto já existe há 25 anos e é uma cooperação entre EUA, França e Brasil para monitorar e estudar as interações entre o oceano e a atmosfera no Atlântico tropical que afetam o clima regional ao longo do tempo.

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E claro, não é só a acidificação das águas que afeta a vida marinha. Os corais também são afetados pelas ondas de calor (que também atingiram um recorde esse ano). 

“O aquecimento excessivo da água leva ao branqueamento dos corais, que pode ser temporário ou fatal, dependendo da extensão e intensidade, porque destrói uma simbiose entre corais e microalgas. No Atlântico Tropical, já se sabe que os efeitos do El Niño aqueceram fortemente as águas na superfície, e isso vem desde 2023”, conta Cotrim. 

Como resolver esse problema?

De acordo com os pesquisadores, é necessário criar mais áreas marinhas protegidas, além de implementar e fiscalizar a legislação existente no que diz respeito à poluição. Parte dessas medidas passam também pelo reflorestamento, já que “não existe esforço de reflorestamento que consiga ‘absorver’ as quantidades absurdas de emissões anuais de CO₂”, diz Cotrim. 

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Musetti reforça que “a redução nas emissões de CO₂, dentre outros gases de efeito estufa, é uma medida essencial na mitigação das mudanças climáticas como um todo”, já que a preservação de ecossistemas marinhos depende, também de medidas que cuidem, mantenham e que se expandam para conseguir não só preservar, mas se recuperar dos impactos já sofridos até o momento. 

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