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Como a vida de Alan Turing pode inspirar a sua

"Ao final do século o uso das palavras e a opinião das pessoas educadas terão mudado tanto que alguém poderá falar de máquinas pensando sem ser contrariado"

Por Salvador Nogueira
Atualizado em 9 abr 2017, 14h24 - Publicado em 7 abr 2017, 17h51

É possivelmente a mais trágica das histórias contidas neste especial. Alan Turing era um pensador absolutamente brilhante, que caminhava como poucos entre a visão do futuro e a realização do presente, produzindo conceitos e abordando problemas matemáticos que intrigam e fascinam até hoje, quase um século depois.

Mais que isso, foi um herói de guerra. Sim, isso mesmo. Ou herói é só aquele que pega em armas e vai para as trincheiras? Turing se apresentou para trabalhar em Bletchley Park, a estação de trabalho da organização de quebra de códigos britânica, no dia seguinte à declaração de guerra do Reino Unido à Alemanha. No dia seguinte. E seus resultados – ao lado de outros matemáticos brilhantes, é verdade –  certamente ajudaram e muito na vitória contra o nazismo. Alguns estudiosos estimam que o trabalho dele pode ter encurtado a guerra  em 2 a 3 anos!

E então, depois de ser condecorado, Turing sofre todo tipo de humilhação por ser gay? Não estamos falando da Idade Média, estamos falando de 1952!

O preconceito é um mal que envenena a humanidade desde sempre. É bem verdade que cada época produz seus próprios preconceitos, que costumam ser diferentes entre si, e há épocas de maior ou menor acirramento, mas o fato é que até hoje não conseguimos em nenhum momento libertar a sociedade da presença perene dos pré-julgamentos e da ignorância contra o diferente.

Enquanto era a vítima – primeiro silenciosamente, depois de maneira escancarada – de um certo conjunto de preconceitos, no caso, contra homossexuais, Alan Turing estava já nos prevenindo contra um outro conjunto de preconceitos, que ainda nem pudemos manifestar com tanta clareza: aquele direcionado contra as máquinas pensantes.

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É charmoso pensar que, enquanto duelava para fazer valer seu direito a ser diferente do que o padrão social vigente deveria ser, o matemático especulava sobre como tratar – e avaliar – máquinas que atingissem capacidade cognitiva similar à nossa.

Não está nos propósitos aqui discutir a possibilidade ou a viabilidade de máquinas inteligentes (embora, como o próprio Turing sugeriu que aconteceria, todo mundo já concorda a essa altura que essa discussão existe; não se trata mais de um delírio projetado sobre um futuro incerto). Mas é notável que o próprio matemático já estivesse preocupado em formular um teste que nos ajudasse a determinar em que ponto uma máquina pode ser considerada inteligente, pré-requisito fundamental para então entrarmos na discussão  de que direitos ela pode vir a ter, nessas circunstâncias.

Absurdo? Bem, se você teve essa reação, aí é que está o problema! Se partirmos do pressuposto de que estranhamento é justificativa para um pré-julgamento, estamos repetindo os erros do passado – os mesmos erros que muito provavelmente levaram Turing ao suicídio. Temos de aprender a conviver com o diferente – ideias, comportamentos, opiniões, valores. Calcados no pressuposto  de que as liberdades individuais são um valor maior e universal, deveríamos nos esforçar conscientemente para evitar pré-julgamentos – sejam eles motivados por uma discussão sobre orientação sexual, sejam por cérebros de silício.

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