Cientistas usam coquetel de drogas para regenerar pernas de rãs
A rã-de-unhas-africana não consegue regenerar membros depois de adulta. Mas uma combinação de cinco substâncias conseguiu reconstituir pernas amputadas dos animais em 18 meses.
Todos os animais são capazes de regenerar tecidos – uns mais, outros menos. Lagartos e salamandras, por exemplo, não precisam se preocupar com a perda de uma perna ou cauda, porque conseguem logo produzir uma nova. Mamíferos, por outro lado, não são exatamente experts nesse assunto.
Embora o fígado humano impressione por sua capacidade de regeneração (até 75% de sua forma original), geralmente reconstituímos apenas pequenas porções de pele (por exemplo, quando você sofre um arranhão), vasos sanguíneos e nervos. Quem nos acompanha nas limitações é a rã-de-unhas-africana (Xenopus laevis).
Esse anfíbio pode reconstruir membros antes de sua metamorfose, mas perde capacidade regenerativa quando se torna adulto. Por isso, pesquisadores usam a espécie em experimentos que visam restaurar a forma e a função de tecidos – estratégias que, talvez, possam ajudar pacientes humanos no futuro.
Cientistas já tentaram usar implantes de células-tronco e terapia genética desencadear a regeneração nas rãs. Mas uma abordagem relativamente mais simples é estimular o próprio organismo do animal a reconstruir um membro amputado. Esse foi o objetivo de uma equipe de pesquisadores americanos em um estudo publicado recentemente no periódico Science Advances.
A ideia era criar um ambiente propício para a regeneração e esperar o organismo das rãs fazer sua parte. Os cientistas da Universidade Tufts e de Harvard (ambas nos Estados Unidos) começaram o experimento com 115 rãs adultas. Eles anestesiaram os animais e amputaram uma de suas pernas.
Em seguida, as rãs foram divididas em três grupos. Os pesquisadores colocaram os animais em um equipamento chamado BioDome: uma tampa de silicone, semelhante a um dedal, preenchida com hidrogel de proteína de seda.
O primeiro grupo colocou o equipamento no coto (parte restante do membro amputado) por 24 horas; enquanto o segundo utilizou o BioDome da mesma maneira, mas carregado com um coquetel de drogas. Foram cinco substâncias no total: 1,4-DPCA, BDNF, hormônio do crescimento, RD5, e ácido retinóico.
Cada uma tinha um propósito diferente: conter uma possível inflamação; inibir a produção de colágeno pelo organismo (e, portanto, um processo de cicatrização); ou estimular a regeneração de tecidos – como vasos sanguíneos, nervos e músculos.
O terceiro grupo de rãs não recebeu nenhum tratamento, servindo como o controle do experimento. Como esperado, eles não regeneraram o membro inteiro: desenvolveram apenas pequenas estruturas semelhantes a espinhos no coto.
Após 18 meses, as rãs que utilizaram o BioDome sem medicação apresentaram algum crescimento do membro, mas o destaque ficou para a combinação do equipamento com o coquetel de drogas. O grupo de animais que recebeu essa intervenção desenvolveu uma estrutura semelhante à perna amputada, com ossos, nervos, cartilagem e, às vezes, a ponta de um dedo do pé.
Os membros não era perfeitos, mas funcionavam: as rãs conseguiram nadar com as novas pernas como fariam normalmente, e os membros regenerados responderam aos estímulos de toque feitos pelos pesquisadores.
“O fato de ter sido necessária apenas uma breve exposição às drogas para iniciar um processo de regeneração de meses sugere que rãs, e talvez outros animais, possam ter capacidades regenerativas adormecidas que podem ser acionadas”, afirma Nirosha Murugan, autora principal do estudo, em comunicado.
Agora, os pesquisadores pretendem testar essa intervenção em roedores – um desafio ainda maior, visto a capacidade limitada de regeneração em mamíferos. Uma coisa é certa: ainda serão feitas muitas pesquisas antes que um tratamento como esse seja administrado em pacientes humanos. Mas, para os cientistas, este é um começo.