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A Cordilheira dos Andes protege mesmo o Brasil de furacões?

Vídeos exaltando a cadeia montanhosa viralizaram nas redes sociais. Entenda como ela influencia no clima do país e no restante do continente.

Por Manuela Mourão
19 out 2024, 14h00

A chegada do furacão Milton na Flórida na última quarta-feira (9) recebeu ampla atenção nas redes sociais. No TikTok, por exemplo, moradores de lugares atingidos publicaram vídeos mostrando o dia a dia em meio a ruas alagadas e casas destruídas gravando vídeos em ruas alagadas.

Na parte debaixo do globo, o Milton gerou um fenômeno curioso: no Brasil, viralizaram fancams sobre a Cordilheira dos Andes. Fancams são vídeos compilados feitos para exaltar alguém (no caso, uma cadeia montanhosa). Algumas das publicações atingiram nove milhões de visualizações.

Esse viral começou graças ao rumor de que a cordilheira seria responsável por impedir a chegada de furacões por aqui, atuando como uma “barreira natural” contra fenômenos do tipo. Mas, afinal: isso aí é verdade mesmo? 

Não. A cadeia montanhosa não tem nada a ver com a falta de furacões no Brasil. Vamos entender por quê.

Aqui não

De acordo com as fancams, os furacões se formariam na costa do Chile, atravessariam a Argentina, o Paraguai e chegariam ao Brasil pelo Mato Grosso do Sul, percorrendo mais ou menos 4 mil quilômetros. O problema dessa lógica, porém, é que o Chile não costuma receber furacões.

Os furacões não ocorrem no nosso vizinho latino devido a uma combinação de fatores geográficos e climáticos específicos. Primeiramente, as águas do Pacífico Sul, que banham as costas chilenas, são muito frias, com temperaturas geralmente abaixo de 20 °C. Tempestades tropicais precisam de águas quentes, acima de 27 °C, para se formarem e se intensificarem.

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Além disso, a formação de um furacão requer uma certa uniformidade na intensidade e direção dos ventos, condição que não é atendida nas regiões chilenas.

Embora o país não enfrente o risco de furacões, é possível que ele enfrente ciclones extratropicais, que apresentam características e efeitos distintos, como ventos fortes e precipitações. Esses ciclones, porém, mas são menos intensos e destrutivos.  

Caminhos alternativos

Ainda segundo os vídeos virais, os furacões poderiam seguir uma segunda rota antes de serem “barrados” pela cordilheira seria saindo, da costa do Peru e entrando no Brasil pelo Acre. Só que não.

Isso porque ambos os países, Chile e Peru, dividem a corrente oceânica de Humboldt (ou Corrente do Peru), que faz com que as águas peruanas sejam tão frias quanto as chilenas.

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Os furacões, então, não vêm pelo Pacífico. A única opção seria se eles se formassem do outro lado da América do Sul, no oceano Atlântico. O que aconteceria se o vendaval atacasse, por exemplo, o litoral da Bahia? 

As águas de Salvador alcançam no máximo seus 26 °C. Com os mares um pouquinho mais quentes, essa situação poderia se tornar um perigo. Claro que seriam necessários outros fatores, como mudanças de pressão, ventos e umidade, mas com o aumento de um grau dessa temperatura, a possibilidade do acontecimento desse fenômeno no Brasil também cresceria. 

“Por enquanto, é quase impossível que um furacão atinja o Brasil, a não ser que as mudanças climáticas também tenham alguma influência”, disse Michael Pantera, meteorologista do Centro de Gerenciamento de Emergência (CGE), à BBC.

Contudo, o que pode acontecer é o que vem sendo observado pelos últimos 20 anos. Foram registrados a formação de ciclones tropicais na costa brasileira, sob águas mais quentes, atingindo até o status de tempestade tropical (ventos entre 60 km/h e 120 km/h), classificação que vem antes do furacão (ventos acima de 120 km/h). São os casos das tempestades Anita (2010), Iba (2019), 01Q (não nomeada pela Marinha do Brasil) em 2021 e Akará (2024).

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Ou seja, daqui a uns anos, com o aquecimento global, essa realidade pode ser diferente, e essas tempestades podem escalar para a próxima fase.

Mas é preciso ressaltar que as características da atmosfera do hemisfério sul não favorecem o surgimento de furacões. Isso porque, para baixo da linha do Equador ocorre o cisalhamento, um atrito indireto entre camadas de vento e correntes divergentes, com intensidades e direções distintas. “Os furacões ‘não gostam’ disso [ventos irregulares]. As condições não são favoráveis”, explica Ricardo de Camargo, professor de meteorologia da USP, em entrevista à revista Planeta.

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